Regras de arredondamento do IVA

Como arredondar o IVA: por linha vs pelo total, exemplos práticos e casos‑limite segundo a legislação portuguesa.

Verificado com fontes AT 04/11/2025

Para quem é: caixas/operadores de POS, equipas de e‑commerce, contabilistas e developers.
O que vai encontrar: diferenças "por linha" vs "pelo total", exemplos reais (incl. preços "impossíveis"), e a abordagem recomendada para faturação e DP do IVA.

Resumo em 30 segundos (TL;DR)

  • A lei portuguesa permite arredondar o IVA "pelo total" da fatura ou "linha a linha" (por taxa). Em ambos os casos, arredonda‑se para a unidade monetária mínima com a regra aritmética 0,5 para cima (half‑up).
  • Faturas e SAF‑T (PT) expõem o total com 2 casas decimais; os programas certificados devem exportar GrossTotal com duas casas (logo, no documento final há sempre arredondamento aos cêntimos).
  • Preços com IVA incluído: a base é obtida pela fração 6/106, 13/113 ou 23/123, conforme a taxa.
  • Na UE, não há um método de arredondamento único imposto: cada Estado‑Membro define as regras respeitando neutralidade e proporcionalidade.
  • Recomendação prática:
    • → B2C/preços com IVA incluído: calcule o IVA pelo total usando a fração (23/123, 13/113, 6/106).
    • → B2B/preços sem IVA: escolha um método e seja consistente; para a DP, confira sempre as taxas aplicadas ao somatório das bases por taxa.

O que a lei realmente diz (sem rodeios)

1. Arredondar por linha ou pelo total, ambos válidos

A Autoridade Tributária (AT) esclareceu que o IVA pode ser arredondado "de uma só vez" (pelo total da fatura por taxa) ou várias vezes (linha a linha), "por excesso se a fração for ≥ 0,5; por defeito no caso contrário". É a regra clássica de arredondamento aritmético half‑up.

2. Documentos com 2 casas decimais

No Despacho n.º 8632/2014 (requisitos técnicos de programas certificados), o campo GrossTotal do SAF‑T (PT) é numérico com duas casas decimais, o que na prática obriga o total da fatura a cêntimos.

3. Quando o preço já inclui IVA (retalho, e‑commerce B2C)

O artigo 49.º do CIVA determina como apurar a base tributável a partir de um total com IVA: dividir por 106/113/123 (taxas 6/13/23%) e arredondar para a unidade mais próxima (half‑up).

4. Contexto europeu

O Tribunal de Justiça da UE (caso J D Wetherspoon, C‑302/07) afirmou que o direito da UE não impõe um método único; cabe a cada país definir regras de arredondamento, respeitando neutralidade e proporcionalidade.

Nota para software: além de expor 2 casas no documento, é boa prática calcular internamente com mais casas para evitar erros em descontos/quantidades fracionadas; esta prática é destacada em orientação técnica profissional e no ecossistema de software certificado.


"Por linha" vs "pelo total" — qual a diferença?

1) Arredondar por linha (linha × taxa → arredonda → soma)

  • Prós: os subtotais de cada artigo batem certo com o que o cliente vê em linha.
  • Contras: em cestos com muitos itens de baixo valor, pode somar alguns cêntimos a mais face ao método "pelo total".
  • É suportado e comum em vários programas de faturação (configurável).

2) Arredondar pelo total (soma das bases por taxa × taxa → arredonda)

  • Prós: minimiza diferenças de arredondamento; tende a alinhar melhor com o apuramento por taxa na declaração periódica.
  • Contras: a distribuição "perfeita" por linha pode precisar de um acerto de 0,01 € numa linha específica (ver "Como distribuir diferenças", abaixo).

Ambos são válidos em Portugal — a decisão é operacional. O essencial é ser consistente e documentar o critério.


Exemplos trabalhados (com números reais)

Regra de arredondamento: half‑up aos cêntimos (0,005 → sobe).

A) Cesta B2B (preços SEM IVA) — taxa 23%

Três artigos × 1,99 € (base), taxa 23%

  • Por linha: 1,99 × 23% = 0,4577 → 0,46 € de IVA por linha. 3 linhas ⇒ 1,38 € de IVA; total = 7,35 €.
  • Pelo total: base total 5,97 × 23% = 1,3731 → 1,37 €; total = 7,34 €.
  • Diferença: 0,01 €. (Inevitável em certas combinações.)

B) Preço COM IVA incluído — aplicar o art. 49.º CIVA

Total 25,00 € à taxa 23%

  • IVA = 25 × 23/123 = 4,67 € (arred.).
  • Base = 20,33 €.
  • (Use sempre 6/106, 13/113 ou 23/123 quando o preço já inclui IVA.)

C) "Carrinho" com micro‑preços (efeito amplificado) — taxa 23%

Quatro linhas × 0,03 € (base)

  • Por linha: cada linha 0,03 × 23% = 0,0069 → 0,01 €; 4 linhas ⇒ 0,04 € de IVA.
  • Pelo total: (4×0,03)=0,12 × 23% = 0,0276 → 0,03 €.
  • Diferença: 0,01 €.

"Preços matematicamente impossíveis" (e como lidar)

Nem todos os totais com IVA (ex.: 25,00 € a 23%) resultam de uma base com duas casas decimais multiplicada por 1,23. Na prática, o que existe é um arredondamento coerente entre base e IVA: calcula‑se o IVA pelo total (23/123) e arredonda‑se; a base é o total menos IVA. É um comportamento típico e esperado em faturação B2C.


Abordagem recomendada (por perfil)

Retalho/POS e E‑commerce (preços com IVA incluído)

  1. Calcule o IVA pelo total da fatura (por taxa) usando 6/106, 13/113 ou 23/123.
  2. Arredonde a 2 casas no IVA e no total do documento (SAF‑T GrossTotal).
  3. Se precisar de "bater certo" por linha, distribua a diferença de 0,01 € numa linha (ver abaixo).

Faturação B2B (preços sem IVA)

Pode optar por por linha (transparente por artigo) ou pelo total (minimiza diferenças). Seja consistente com a sua política.

Contabilidade/DP do IVA

Ao preencher a DP, confira que o IVA liquidado por taxa corresponde à aplicação da taxa aos somatórios das bases (o que reduz as diferenças de arredondamento acumuladas). A Ordem dos Contabilistas explica este alinhamento e contextualiza as diferenças residuais.

Developers (como evitar "cêntimos fantasma")

  • Interno: calcule com ≥ 4–6 casas (decimais) e só arredonde ao expor subtotais/total.
  • Documento: o total final deve sair com 2 casas (SAF‑T GrossTotal).

Distribuição de diferenças (pseudo‑algoritmo):

  1. Compute IVA_pelo_total por taxa e arredonde.
  2. Compute IVA_soma_linhas (linha×taxa, sem arredondar; depois arredonde por linha se mostrar na UI).
  3. Dif = IVA_pelo_total − soma(IVA_linhas_arred.).
  4. Se Dif ≠ 0, acrescente ±0,01 € à linha com maior parte decimal (ou à última), gerando um "acerto de arredondamento" auditável.

(Muitos programas expõem uma configuração "por linha" vs "pelo total" — documente a sua escolha.)


Perguntas frequentes (FAQ)

O arredondamento "de banqueiro" (banker's rounding) é permitido?

Não é o que a AT recomenda: a regra é aritmética 0,5 para cima (igual ou superior a meia unidade do cêntimo → sobe; caso contrário → desce), tanto "por linha" como "pelo total".

Quantas casas decimais devo mostrar?

No documento final (e no SAF‑T GrossTotal) são 2 casas. Internamente, use mais casas para evitar acumulação de erros e só arredonde no fim.

E se o meu software calcular diferente do meu contabilista?

Ambos os métodos são válidos. O importante é: 1) consistência do critério; 2) explicitar o método na política de faturação; 3) na DP, validar os campos de IVA por taxa a partir do somatório das bases.


Ligações úteis

Ver também

Fontes oficiais (principais)

  • AT — Ofício‑Circulado n.º 53314 (1988, SIVA): arredondamento por linha ou pelo total; regra 0,5 para cima. [Portal das Finanças]
  • CIVA (versão consolidada)Art. 49.º (cálculo da base em faturas com IVA incluído: 6/106, 13/113, 23/123). [Portal das Finanças]
  • Despacho n.º 8632/2014 — Programas certificados; SAF‑T GrossTotal com 2 casas decimais.
  • TJUE C‑302/07 (J. D. Wetherspoon) — a UE não impõe método único; cabe ao Estado‑Membro. [EUR-Lex]

Aviso legal: Este conteúdo tem caráter informativo e não constitui aconselhamento fiscal. Consulte a sua contabilidade para casos específicos ou setores regulados.